Podes pedir-me um beijo nos dias de escarlate
quando as trepadeiras sangram
e eu visto a leveza dos vinte anos e dos outros
que decidimos guardar para não morrer.
Sabíamos que tudo havia de passar -
os muros, a trepadeira, o coro das velhas pela noitinha,
a tua mão pedindo a minha no declive da serra,
na ameaça do tojo.
Continuámos a desbravar ruínas,
a construir palácios de ninguém,
a apregoar unguentos,
que as feridas não soubemos afastar.
Breve foi o tempo, grande foi o lugar,
saudosa a guerra que ninguém perdeu,
amor menino que não envelheceu.
A trepadeira vive, o meu vestido é leve.
Nenhum beijo tem mais de vinte anos.
Digo-te sim nos dias de escarlate.
Licínia Quitério