25.2.14

HOMENS COMO ESCADAS


Há homens que são como escadas
quando sobem o abrir dos dias,
com uma sombra pela mão e as meninas
dos olhos vestidas de seda escura.
Ao fim do dia são ainda escadas,
mas a sombra fugiu-lhes da mão
e perdeu-se na escrita dos países,
enquanto falavam de números
ou calavam a opacidade dos sonhos.
Há homens tão belos como as rendas
de ferro onde poisam os braços,
a descobrirem o fio de claridade
com que traçam as sombras.
Homens como escadas, 

transeuntes, oblíquos,
de poros luminescentes.

Licínia Quitério

Foto de Maria Emília Homem da Costa

16.2.14

UMA DANÇA


Aberta na tormenta,
coro de aflições, de perdições. 
Vão as dunas, vão as casas, 
vão as certezas
na sucessão dos dias. 
Pairam afectos, versos, 
acordes incoerentes. 
Ficou-nos na memória 
o amarelo-oiro dos narcisos 
impedidos de florir. 
Tudo muda, tudo se refaz, 
tudo se constrói e se destrói. 
Sempre e nunca é uma dança que nos dói.

Licínia Quitério

8.2.14

OS DIAS


Animais perseguidos, os dias 
fogem em direcção ao poço, 
ao princípio onde crescem 
os botões de luz, as ervas, 
os ribeiros ou o pequeno nome
onde se ergue um homem.
Na pressa de chegarem,
os dias deixam penas,
cascas de árvore, casas,
cantos solenes de morte e nascimento.
Imensa a tela onde se escrevem
músicos, poetas, pintores,
santos e vagabundos. 
Todos procuram o travão dos dias,
a explicação da treva, 
a distância que vai do braço 
ao arco, dos olhos à janela.
Correm os dias, perseguem
e são presa, uivam nas clareiras,
lambem os corpos, assinam
a quadrícula que fica das cidades.

Licínia Quitério

2.2.14

SABER


Saber que amanhã tudo será diferente


Que o gelo se derrete e a água 
escorre em desafio à sede
que vai e volta e vai e volta 
e nunca se detem porque
nada termina ou principia

Licínia Quitério

foto de Hugo da Silva

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