16.5.08

SOBREVIVOS


Não sabemos a dor dos peixes

quando seca o lago em pleno verão.


Premonições tiveram

e amorteceram cintilações nocturnas.

Enfeitaram de escamas o relevo dos fundos

a assegurar refúgio às últimas frescuras.

Por entre o lodo chegaram

outras guelras, outras mãos

e o novo tempo lhes chamou anfíbios.

Têm o ar robusto dos sobrevivos.

Desconfiam da firmeza da terra.

Vão pedindo à chuva notícias do lago.

Só ela sabe quanta devastação.


Licínia Quitério

18 comentários:

hfm disse...

Um poema que vai subindo de tom como uma melodia - incansável a luta das palavras. Belíssimo!

Manuel Veiga disse...

a vida é assim - o que não mata robustece...

regressaremos. mais fortes e solidários!...

admirável poema. beijo

bettips disse...

Deve ser por causa do Mosteiro e do seu efeito! Blimunda sábia e a Passarola...
Uma alegria encontrar-te assim na estrada, sobrevivente, forte, doce (não severa, severa sou eu!), interveniente, premonitória da seca? A terra vermelha duma ilha e uma casa de sol, lavar-se no mar para poupar a água...era preciso viver assim para que a natureza fosse amaciando a carne, o cabelo, a doença...
Beijinho

pin gente disse...

a água em lodo o sol abrasa
tira vida, transparência, luz
na sua superfície já reluz
um corpo resequido e sem casa


abraço
luísa

Justine disse...

Pressinto algum desalento na beleza crepuscular do teu poema.
Emocionante, contudo, e forte.
Bom fim de semana

maria josé quintela disse...

sobrevivência


no estado sólido!


um beijo.

Graça Pires disse...

Só os que lutam sobrevivem...
Um beijo Licínia.

M. disse...

Requintado. É o que sei dizer do teu poema.

Mar Arável disse...

o TEU LAGO

ESTÁ VIVO

CANTA

SOLIDÁRIO

LEVANTA-SE DO CHÃO

Alberto Oliveira disse...

Um belo poema onde se lê angústia e sufoco porque imaginar a dor dum peixe fora do seu elemento é exercício impossível a um humano.

.................................

Noutro contexto (menos dramático) devo dizer que me faz alguma impressão ver no prato um peixe inteiro como é o caso das sardinhas -que morrem óbviamente de desregulada tensão arterial, tal o sal com que as cobrem, ou das pescadinhas de rabo na boca, que entregam a alma ao criador, após sofridas práticas torturantes abjectas. Não sei porquê mas acho que esta noite vou ter algum sonho horrível com milhares de peixes a serem dizimados

Amanhã vou comer carne de porco à alentejana amanhã vou comer carne de porco à alentejana amanhã vou comer carne de porco à alentejana amanhã vou comer carne de porco à alentejana amanhã

beijinhos.

batista disse...

“Não sabemos a dor dos peixes
quando seca...”

sabemos a dor dos outros
quando nossos olhos se orvalham?
os versos que nos chegam d’um sítio nunca visto
mitigam a sede de quem sede de versos tem.

grato, Amiga: de coração.

Anónimo disse...

guelras a procurar respirar :) um grande beijinho, licínia.

Maria Laura disse...

Protegeram-se e sobreviveram. Esperam o lago. Virá, um dia.
Belíssimo poema.

Fátima Santos disse...

“Não sabemos a dor dos peixes
quando seca...”
não sabemos...

Unknown disse...

Lindo poema. Parabéns.
Eduardo Aleixo
( À Beira de Água )

São disse...

Desconhecemos a dor alheia sempre, por muito próxima que nos esteja.
Beijos.

un dress disse...

respiramos pó

água respiramos

[ às vezes

nada






beijO

Arábica disse...

Peixe sou.


Beijinho.

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