O rapaz do violoncelo,
melhor, o rapaz com um violoncelo, ou antes, o violoncelo que era um rapaz. Era
o braço ou o arco, a cintura ou as ancas do violoncelo onde as mãos do rapaz poisavam, que as mãos do rapaz afagavam, que as mãos do rapaz castigavam.
Na ponta do
arco havia uma luz que arranhava a noite, que pintava gritos na escuridão.
Quando o
rapaz era pássaro, o violoncelo trinava. Quando o rapaz era dor, o violoncelo gemia.
Quando o rapaz era o rapaz, o celo era também o rapaz e o celo-rapaz e o
rapaz-celo rodopiavam e o silêncio nascia. Breve silêncio, feito de um amor
nascido, de um amor crescido, de um amor à beira de morrer.
Depois,
houve o incêndio e a luz na ponta do arco era o perfil de um rosto em labareda.
O corpo e o celo ganharam outras formas e partiram, a cavalgar gorjeios e
soluços.
Assim se faz
a mansidão das noites dos rapazes de lume que por vezes são arco e dão o corpo
ao celo, e de quem se diz, no chão da indiferença – “Não era mais do que o rapaz
do violoncelo”.
Licínia Quitério
1 comentário:
Hoje vou ouvir um violoncelo.
Lindíssimo o que escreveste.
Um beijo, Licínia.
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