Não tentes perceber o que escrevo.
Eu estou sempre por fora
do que escrevo.
Salto sobre as palavras, agarro-as para logo as largar.
Alguém
que se atreva a domá-las, revoltas, insubmissas, impalpáveis.
O gato salta sobre
o pássaro, joga com ele a vida e a morte.
Não há uma palavra que diga o
intervalo entre a garra e a pena.
Foi ontem que libertei um pássaro.
Foi ontem
que me libertei de mais uma morte.
Escrevo tudo isto a pensar em jogos inúteis,
em seduções inúteis.
Vou arrancando ervas e matando lagartas que comem as
ervas.
Não há uma palavra que diga o antes e o depois do que acontece quando
liberto um pássaro ou esmago uma lagarta.
Não há de facto uma palavra para vida
e morte.
Porque não tenho essa palavra, não tentes perceber o que escrevo.
Lê,
apenas, deitado na torrente que te leve.
Licínia Quitério
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