Na casa da avó havia um quintal. Nas casas dos ricos havia jardins. E havia roseiras e a avó chamava belas-portuguesas às rosas que elas davam. As couves galegas eram muito altas. Algumas mais altas que os netos mais altos. As folhas de baixo iam para os coelhos que tinham um olhar assustado. A pereira dava peras francesas que os bichos, antes dos netos mais velhos, atacavam sem dó nem piedade. No quintal da avó havia um alegrete. Nunca mais encontrei nenhum. Era uma tirinha comprida de terra e tinha à volta um murinho de cimento caiado de branco. Como um canteiro. Mas não era. Era um alegrete. Todo o ano tinha flores. As minhas preferidas eram os brincos-de-princesa. Dava um trabalhão catar as lagartas e matar os caracóis e as lesmas. A avó capava os craveiros e assim os cravos que resistiam à capadela eram enormes. Por esta altura do ano estavam quase a florir as alcoviteiras-da-primavera. A avó nunca soube que se chamavam frésias. Ao sair da porta da cozinha a avó tinha plantado uma roseira que tinha crescido muito e dava rosas-de-toucar. O quintal da avó era enorme. Tão grande que hoje fizeram nele uma salinha de um restaurante. O resto do restaurante é o resto da casa que foi da minha avó. Quando lá vou almoçar procuro ficar na mesa debaixo da pereira das peras francesas. Se levo amigos, digo sempre "Vamos ao Alegrete". Depois acham que eu estou a brincar porque o nome do restaurante não é esse. Porque é que havia de ser?
Nota: Este texto não tem nada a ver com O Sítio do Poema, dirão. Fantasias minhas, de fim de ano.
Até 2009. Por aqui voltaremos a encontrar-nos.
Licínia Quitério