23.11.12

RUMOROSAS AS ASAS


Rumorosas as asas ou as mãos na palidez do rosto. Do meu rosto em frente à pedra, na lembrança viva da pedra, nas rosas de pedra antes vivas, latejantes, e o seu sangue quente atravessando-me os dias, do oriente ao ocaso.  Dias e noites trepidantes com a febre nas têmporas, um vidro vermelho no candeeiro, uma canção de embalar, as sombras, as sombras na parede. Um morcego, uma borboleta, as orelhas do coelho, as asas, altíssimas. As manchas no teto, os mapas dos países de ida e de volta, uma dor sem princípio, a pedra enegrecida pela fuligem que fica nas mãos quando um amor morre. Santas mãos, miraculosas, berços, catres, esquifes, doçura tanta, mágoa infinita, viandantes mãos sem corpo, no meu corpo de antes, no meu corpo presente, no meu corpo futuro, no meu copo, no teu copo, no nosso copo de todos os dias, agora e em todas as horas, vazio e pleno, ofertado e recusado. Só as mãos nos acodem, no negrume e na alvura, na cupidez e na devassa, na sede e na fome, no primeiro dia, no último dia. Sempre. 


Licínia Quitério

21.11.12

NO SILÊNCIO DE SEDA

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Erguias  muros e sorrias nas esquinas que dobravas, deixando para trás, aflitos, os emparedados do sol. Ensinaram-te a dizer palácio e sonhavas com a seda a roçar-te a nudez. Para sempre triunfante, pensavas, aprisionada a maldição divina no labirinto indecifrável. Livre, dizias-te, saciada a fome na prata dos banquetes. Diariamente decidias da vida e morte de estrelas. Todo o poder dos mundos no toque dos teus dedos. Reinavas, marmórea, no silêncio de seda,  na mais perfeita solidão dos muros.

Licínia Quitério

11.11.12

NASCEU

OS SÍTIOS já tiveram a sua apresentação ao público, feita com a elevação que a HÉLIA CORREIA põe em tudo o que diz e escreve. Foi uma tarde de encontros e abraços e risos, dos amigos de hoje e de sempre. A Poesia foi bem tratada, bem escutada, bem festejada. O livro aí está a dar os primeiros passos em direção aos leitores. 
Para meu contentamento, a Hélia disse dele: 

"Esta poesia é logocêntrica - a palavra é o centro de onde se parte e onde se volta, sobre o qual se medita, cuja luz esclarece tudo o mais e que ainda nos convida a uma espécie de curiosidade científica sobre a linguagem, quase experimentação: (Há um conhecimento do ofício, uma competência técnica quanto baste)."

Quem o quiser adquirir pode contactar-me por e-mail para 

liciniaquiterio@sapo.pt 

8.11.12

OBLÍQUO

O sol oblíquo nas tábuas, digo baixinho. Demoro-me na obliquidade da linha de sol, no seu tempo angular, na sua origem celeste, no seu efeito de régua sobre as tábuas. Enquanto digo e penso, o ângulo altera-se, aumenta ou diminui, de um lado ou de outro das tábuas, e eu permaneço, relativamente indiferente ao avanço do degrau de sombra a lamber-me os pés, na absoluta indiferença das tábuas ao seu toque, agora a apagar-se, a apagar-me as palavras sobre a efemeridade das linhas de sombra. Baixinho disse - o sol oblíquo nas tábuas. Assim sempre. 


Foto de escultura de Cargaleiro

Licínia Quitério

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