21.10.19

PODIA DIZER-TE


Podia dizer-te a luz da tarde acesa na janela,
ou a alegria envergonhada das ramadas,
ou as vozes dos amigos esboçando um fado,
ou a  nostalgia das bandeiras reclamando pátrias,
ou ainda as casas, sim, as sábias, astutas casas
debruadas de amores e perdições.

Podia até pintar uma aguarela, ou escrever um poema,
ou modelar um rosto, ou compor um adágio,
ou soltar um grito, ou correr, ou saltar,
ou abraçar-te, ou lançar um papagaio de papel
e depois dizer-te: Vês, eu não sei nada. Ou então:
Que queres de mim? Ou (por que não?): Amo-te.

Não podia mudar o coração da terra
nem a esperança fechada nas mãos dos homens
quando sofrem.

Licínia Quitério, 2010

20.10.19

NOVO LIVRO


11.10.19

O LAGO



Havia terra e árvores, em redor do lago.
Havia rãs e cágados e cobras de água, dentro do lago.
O lago tremia inquieto pelos seus bichos.
Vinham de terra outros bichos beber água no lago.
Havia homens e mulheres que vinham olhar o lago, só olhar.
Despediam-se felizes, até um dia, lago.
Chora o lago com lágrimas terra adentro.
Ninguém sabe para onde foram os bichos do lago.
Ninguém sabe para onde foi a água do lago
que agora não é mais que o desenho do lago.
As árvores em volta estão tristes. Esperam que a água
volte e com ela os bichos do lago e os outros que vêm de terra
e os homens e as mulheres que olham o lago, só olham,
e se despedem, até um dia, lago.

Foto de Fátima Casals

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