21.10.19

PODIA DIZER-TE


Podia dizer-te a luz da tarde acesa na janela,
ou a alegria envergonhada das ramadas,
ou as vozes dos amigos esboçando um fado,
ou a  nostalgia das bandeiras reclamando pátrias,
ou ainda as casas, sim, as sábias, astutas casas
debruadas de amores e perdições.

Podia até pintar uma aguarela, ou escrever um poema,
ou modelar um rosto, ou compor um adágio,
ou soltar um grito, ou correr, ou saltar,
ou abraçar-te, ou lançar um papagaio de papel
e depois dizer-te: Vês, eu não sei nada. Ou então:
Que queres de mim? Ou (por que não?): Amo-te.

Não podia mudar o coração da terra
nem a esperança fechada nas mãos dos homens
quando sofrem.

Licínia Quitério, 2010

1 comentário:

Mar Arável disse...

Quando asfixiamos um pássaro nas mãos
desenhamos no chão a dor que sentimos
Bj

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