17.10.12

A NOVA ESTAÇÃO


Escuta, é a primeira chuva da estação. 
A minha boca seca aflora o barro, cheiroso 
à ingenuidade dos presépios da infância 
com seus espelhos-lagos a anularem maldições.
Põe a tua mão sobre a minha. Sente o sangue 
por baixo da pele, as toupeiras por baixo da terra. 
Cegos são e escavam vida inteira suas veias
infindas, desejando a  luz, dela fugindo.
Tens o espanto nos olhos. Há um livro que gorjeia. 
Eu explico - os pássaros andam mudos e eu guardei 
as vozes nos versos brancos dos meus livros.
Depois da chuva, a tua mão longe da minha,
o meu sangue paralelo às toupeiras, o barro
a desfazer-se com a memória dos presépios,
a debandada dos pássaros mudos. Nos livros,
o desenho das pautas dos seus imensos cantos.
É a nova estação. Podes já não escutar.

Licínia Quitério

2 comentários:

Justine disse...

É belo, triste e doce, o teu poema!

Manuel Veiga disse...

depois do tempo evanescente da estações. a memória dos dias...

belíssimo.

beijo

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