7.10.13

O MÁRMORE



Podias lá tu saber, rei de absoluto poder e relativas fraquezas, que, mais de dois séculos volvidos sobre o vulto do teu sonho de pedra, 
os meus olhos ficariam presos numa certa luz, numa certa música que, numa certa hora, se desprenderam da inocência, da brancura, da lhaneza de dois anjinhos, com asas e penas e cabelos anelados, espreitando, um ao outro aconchegados, aquela vastidão, aquela altura, aquela estonteante simetria. Quiseste, ó rei, deslumbrar outros reis, outros reis de reis, outros planetas que ainda não haviam nascido, já que tais nascimentos não houveras decretado. Filhos de teus filhos, que pela grande pedra viriam ao teu mundo, nela receberiam coroas e depois túmulos e as mesmas coroas e outros túmulos, que de tal se faz a vida e a morte dela. Tudo assim foi e assim não foi e tu de nada soubeste, na frieza de outras pedras menos claras. De verdade, os meus olhos agora aqui, absortos, debruçados na longevidade do mármore, no breve tempo dos reis. 

Licínia Quitério

1 comentário:

Manuel Veiga disse...

assim transita a glória do Mundo - coroas e túmulos...

e persistência da pedra no olhar...

gostei deveras!

beijo

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