Que guardam as florestas pela noite?
Duendes, adivinhos, virgens loucas.
Repousos animais, leves respirações.
Olhares que só no escuro
se perdem da cegueira.
Molezas e frescuras vegetais.
Trabalhos lentos, exactos,
de operários incansáveis.
Cumprida a noite, as florestas
preparam as vestes matinais.
Com os cuidados de mulheres antigas,
com véus de névoa encobrem a nudez.
E, quando o novo dia as visitar,
estarão serenas, hirtas,
cobertas dos seus verdes radicais.
Duendes, adivinhos, virgens loucas
são agora invisíveis, impalpáveis.
Tornam-se seivas, agulhas, frutos altos.
Obedecem ao vento. São reais.
Um ar frio e húmido fazia-nos sentir os ossos. Passámos rente à floresta. Só rente, que para lá entrar faltou coragem. Uma luz tímida roçava as copas. Daí a pouco diríamos: Chegou o sol. Um bater de asas ergueu um grande pássaro. Vimo-lo poisar, por entre o nevoeiro, no que seria um ramo ou uma diagonal do quadro. Depois de nos aproximarmos, chamámos-lhe corvo. Negro a diluir-se na tinta acinzentada da manhã. Lá ficou. Parecia imóvel. Em mim se deu um estremecimento. Vi nele a sombra de um companheiro de outras viagens. Miragem de outras florestas que não de enganos. Foi decerto aquele ar frio da madrugada. A afastar lembranças, disse: Com um café quente isto passa.
Licínia Quitério
18 comentários:
Bebeu o café quente e não passou.
o pássaro-companheiro continuava
quedo e mudo. Não voava nem falou.
Era de manhã e não de madrugada.
Talvez se pedisse aquele rissol...
pediu e de repente foi-se a floresta.
Estava no centro da cidade e havia sol.
Suspirou resignada. Não tinha sido desta...*
* que tinha ido à Amazónia
Beijinho.
Se os ângulos das minhas fotos são bonitos, as tuas palavras são maravilhosas!
Beijinhos*
"Sonhas um livro de infância
Que te não é dado ler:
---------------------------"
No Dia Mundial da Poesia, está-se bem aqui.
Beijinho de Primavera.
As florestas são mágicas ou, pelo menos, nós vemo-las assim. Habitadas por espíritos que fazemos nossoa.
Como sempre, um texto fascinante. **
bom dia, poesia neste dia só teu! e que este sítio tenha sempre um poema à hora do chã. adorei ler ;) beijinho muito grande, licínia. o alberto escreveu com sabadoreia. adoro ler tudo o que ele escreve. e a licínia merece tudo de bom. um abraço.
guardam talvez o aroma das tuas palavras. as florestas.
abraço. hoje. dia da Poesia!
correr a floresta.
ouvir a floresta.
a agudíssima
escorrência daS florestaS.
vivaS.
naS memória.
que pouco as florestas
senão trilhos
nós
lamentos
emaranhamentos.
e sim.
a vaga promeSSa da
luZ...
Que textos lindíssimos para celebrar a floresta. E não só.
gosto das "aves nocturnas" que habitam as florestas. e das tuas palavras poéticas que as esconjuram. tens o dom das feiticeiras!
Esta dupla descrição da floresta até a mim me fez doer os ossos, o que é sinal do poder narrativo da autora.
Bjs
TD
Maratona de Poesia em grande! Tive pena de não ir.
Bom fim de semana*
As florestas envolvem uma atmosfera mágica,própria dos poetas.
Texto muito bem estruturado parabéns.
Bom fim de semana
Beijinhos Zita
Que arrepio (de beleza)...
Beijos
Ora bom dia e bom domingo!
Magia, é sempre um excelente indutor de quotidianos.
Bjs
Eu que sou um homem da floresta poderia dizer aqui o que lá se passa durante a noite. Adivinhos e duendes nunca os vi, mas virgens loucas? Ah! isso garanto que sim.
O poema é lindo, Licínia e aprosa final é excelente. Temos aui uma escritora de mérito. Um beijo amigo de saloio para saloia..
Enviar um comentário