22.6.06

PUTA DE VIDA


Toulouse-Lautrec - Au Salon de la Rue des Moulins

AS PUTAS DA AVENIDA

Eu vi gelar as putas da Avenida
ao griso de Janeiro e tive pena
do que elas chamam em jargão a vida
com um requebro triste de açucena

vi-as às duas e às três falando
como se fala antes de entrar em cena
o gesto já compondo à voz de mando
do director fatal que lhes ordena

essa pose de flor recém-cortada
que para as mais batidas não é nada
senão fingirem lírios da Lorena

mas a todas o griso ia aturdindo
e eu que do trabalho tinha vindo
calçando as luvas senti tanta pena


FERNANDO ASSIS PACHECO


Lembras-te do barquinho de papel? Sim, de papel de jornal. Sempre foste muito exacto. Na vela podia ler-se: "Vende-se cachorro". Foi por causa do peso do cachorro que o barquinho adornou. Não, não foi o vento. No vale, o ar estava imóvel. Por isso o charco sem ondas. Foi o meu olhar que empurrou o barco. Se o cachorro se afogou? Não. Saltou a tempo para o ramo do salgueiro. Tu não viste. Estavas tão entretido a matar formigas. Ontem vi o barquinho aos pés da nossa cama. De vela panda. Não ouviste ladrar? Estavas a dormir, eu sei. Já não te interessas por formigas. Eu ainda gosto dos cachorros escritos nos barcos. Até amanhã.

Licínia Quitério

13 comentários:

De Amor e de Terra disse...

Olá Licínia e Parabéns!
Pela escolha (poema e imagem)
pela sua prosa poética, lindíssima.
Obrigada ainda pela sua visita ao meu Blog.
Voltarei, pode crer...
Fiquie fã.
Beijo
Maria Mamede

agua_quente disse...

Também gostei mais do texto. Ainda que lhe tivesse encontrado um gosto levemente amargo.
O do poema é totalmente amargo.
Beijos

JPD disse...

Belos textos.
Beijinhos

Manuel Veiga disse...

Fernando Assis Pacheco, Presente!

o texto é de uma delicadeza tão íntima, que não me atrevo a pertubar, com um ligeiro (e deslocado)comentário...

alice disse...

querida licínia,

espero-a bem e harmoniosa e linda

este post é de uma subtileza tão doce e fina que arrepia, adorei

mas ninguém pediu a minha opinião!

desejo-lhe um bom fim de semana

que o balão de são joão voe no seu coração

agradeço as suas visitas e palavras

um grande, grande beijinho,

alice

DE-PROPOSITO disse...

Um bonito poema, que aborda um tema 'perturbante' para os pudicos (as) deste país e onde nunca se cita porque é que existem, nunca se diz que se não houvesse clientes a situação não acontecia.
Fica bem.
Beijinhos.
Manuel

greentea disse...

SE EXISTEM É PORQUE TÊM CLIENTELA E NÃO SÓ...
HÁ UNS ANOS PUBLICOU-SE NUMA REVISTA UM ARTIGO SOBRE VIDAS DUPLAS.
UMA PSICÓLOGA SUPOSTAMENTE BEM CASADA COM UM EMPRESÁRIO DE BOA SITUAÇÃO, QUE DIZIA ELA AMAVA O SEU MARIDO...
TINHA DIAS EM QUE IA A CASA MUDAR DE ESTILO , DE ROUPAGENS E DE VISUAL E IA PARA A ZONA DA TORRE DE BELÉM, ARMADA EM PROSTITUTA; SÓ "ATENDIA" CARROS DE ALTA CILINDDRADA , BOAS MARCAS PORQUE , PORQUE LHE DAVA OUTROS TONS À VIDA, MAIS ADRENALINA E MAIS NÃO SEI O QUÊ, NÃO SEI SE CALÇAVA LUVAS OU MEIAS DE RENDA OU SE POUSAVA NUA...

UM DIA O MARIDO DESCOBRIU-A, TALVEZ ANDASSE NOS MESMOS MEANDROS, QUEM SABE.
O CASAMENTO ACABOU-SE, COM GRANDE PENA DELA!

UMAS EXISTEM PORQUE TÊM CLIENTELA; OUTRAS PORQUE GOSTAM DE O SER...

Hortência disse...

obrigada pelas delicadas palavras deixadas em meu blog...
beijos

lique disse...

Um poema sobre uma triste realidade. O texto é de uma íntima delicadeza absolutamente extraordinária.
Beijinhos


http://mulher50a60.weblog.com.pt

Era uma vez um Girassol disse...

Fiquei amarga ao ler o poema...Tema que mexe com as mulheres, decerto.
Mas o teu texto ainda me deixou mais.
Bjinho

Alberto Oliveira disse...

Deixei-te aqui um comment que apaguei porque a referência que fiz ao autor do poema que editaste neste post nada tinha a ver com esse mesmo autor mas sim com outro.
Do meu lapso peço desculpa.

Isso não invalida porém que a minha opinião sobre o poema própriamente dito, se mantenha; escrever sobre as duras realidades da vida, incomoda . Mas se assim não se fizer, como havemos de distinguir o paraíso do inferno?
... e que a tua prosa, faz uma óptima companhia a tal poema.

beijos.

Alberto Oliveira disse...

... já agora -porque não?, o o outro autor era Luiz Pacheco; de vida bem diversa da de Assis...

Anónimo disse...

Meu Deus que saudades! tuas, do "matador de formigas" e até minhas!
parabéns amiga...
Filipa Gonçalves

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